Capítulo 1 - Vapor & Arcanina

- Por favor, subam - chama Sanna, do andar superior.
Quando todos estão reunidos, vocês vêm Sanna sentada sobre um dos colchões dispostos no chão, todos cobertos por mantas fina para proteger do frio que estrava pela janela quebrada. O quarto era grande, pobre de móveis, gelado e bolorento, mas serviria bem para um noite de refúgio.
- Bem, pra começar, fico feliz que tenhamos conseguido resgatar nossos três amigos - começa Sanna -, acho que todos aqui são vítimas de uma mesma traição. Segundo uma série de informações que a Malha de Ferro conseguiu coletar, seja extraviando documentos do Conselho, ou mesmo nos infiltrando em Arsin, o Governo do Céu decidiu finalmente mostrar suas garras.
Ela respira fundo, fechando os olhos como se para se concentrar.
- Há muito tempo, cerca de um milênio atrás, ocorreu uma guerra que mudou toda Gaia. Antes, os homens dividiam o mundo com bruxas, fadas, dríades, goblins, e toda sorte de criaturas fantásticas, até que nossa ganância sussurrou em nossos ouvidos que o mundo era nosso por direito, que Eli o havia criado como um presente para a humanidade, e que as criaturas místicas, adoradoras de seus próprios deuses pagão, eram indignas de partilharem da mesma benção que Eli dera aos homens. Foi esse pensamento segregador que iniciou o que hoje conhecemos como Guerra dos Cem Anos, onde os homens, usando de seus inventos, sua capacidade de alterar a forma da magia com suas essências (o Fator Genese), e uma aptidão louvável para a reprodução, conseguiram subjulgar o inimigo e aprisioná-los, segundos as lendas, com o apoio do próprio Eli, nas profundezas do que hoje conhecemos nos manuscritos da Igreja como Dracma.
Sanna toma um gole de água antes de continuar.
- O fato é que a guerra modificou o que viria a ser o "continente médio", Elyin, onde estamos agora, de tal forma que a presença arcana dos místicos ficaria aqui como um lembrete, um resquício que modifica nossos corpos e torna muitos de nós aptos a manipular a magia, assim como nossos antepassados. O Fator Genese é passado de geração em geração, e não sabemos se é passado por nosso DNA ou por outro meio. O importante é que é essa característica que nos permite manipular a magia bruta presente no mundo, usando nossas essências para moldá-las. Cada humano possuidor do Fator Genese é capaz de manipular a magia bruta de uma forma distinta, revelando assim sua natureza, que varia muito ao longo da vida, permitindo que os seres humanos desenvolvam muitas ramificações da magia.
Sana desenha um círculo a giz no chão, onde há uma esfera central com os escritos "Magia Pura" no centro, e quatro outras esferas que são ramificações da maior, contendo símbolos ao invés de letras em seus interiores.
- A magia dos humanos é divida em quatro ramificações da magia pura: Manipulação, que envolve a modelagem da mente e da matéria - ela aponta o símbolo da lua no primeiro círculo menor, que remete à manipulação que a lua exerce sobre as maré e, sua influencia nos sentimentos humanos. - Evocação, que permite manifestar a magia na forma de elementos naturais, como fogo, água, ar, terra, luz e sombras - ela aponta o segundo círculo menos, com o símbolo de um hexagrama, simbolizando os seis elementos naturais de Gaia. - Materialização, que permite manifestar a magia em forma de objetos, muito usada pelos tecnomagos de Arsin - ela aponta o terceiro círculo menor, com o símbolo de um vaso de barro, simbolizando o ofício do artesão, que é capaz de dar forma física às suas criações mentais. - Clarividência que permite a previsão do futuro e a leitura das linhas que compõem o tempo - ela aponta o quarto e último círculo menor, com o símbolo de uma estrela, simbolizando os astros e o conhecimento antigo de previsão através de suas formas e agrupamentos no céu.
Sanna ajeita as madeixas atrás das orelhas, massageando e espaço entre os olhos e o nariz, com o dedão e o indicador.
- É isso que o governo está atrás. Eles possuem todo esse conhecimento, sabem as capacidades que possuímos e o poder de manipulação que magia que os humanos de Elyin possuem. Isso lhes dá medo. Eles temem que um dia Elyin se levante contra o Conselho e lhes ataquem. Sim, assim como "aconteceu" no ataque forjado, e foi justamente isso que fez com que os líderes cedessem e permitissem o envio de tropas do Conselho para realizarem a caça da Malha de Ferro e ajudarem o povo pobre e pouco instruído na tecnomagia - Sana soca o chão com tanta força que vocês ouvem a tábua rachar. - Besteira e mentiras! O que o Conselho deseja é mais claro que o dia: eles querem nos estudar, querem nosso poder, querem se apossar de nossa terra pouco a pouco enquanto usam a caça da Malha como pretexto para entrar em qualquer país, atravessar qualquer fronteira. Vão usar como desculpa o fato de precisarem de matéria para alimentar as novas máquinas para explorar nossas jazidas de arcaninas desenfreadamente. Se farão de bonzinhos, altruístas, como um colonizador mal-intencionado age com uma tribo indígena. Eles nos subestimam, nos tratam como serem inferiores que possuem um tesouro que não deveria nos pertencer...assim como fizemos há cerca de mil anos, com os místicos, o governo de Arsin pretende fazer com Elyin. Eles querem nos tirar o pouco que temos, antes de nos banir deste mundo. A história se repete, de novo, de novo, e de novo, até que a ganância humana nos consuma por completo. O abuso dos recurso poderia fazer Elyin entrar em colapso, gerando terremotos, furacões e coisas piores. A face de Gaia mudaria.

Dakato e Audrey se recordam de terem estudado tudo aquilo sobre o Fator Genese por eles mesmo, em suas idas à Grande Biblioteca de Arsin (GBA). Thomas e Desmond se surpreendem com a trama que a Malha de Ferro parece ter descoberto, e notam que, se aquilo fosse realmente verdade, eles conheciam quase nada do governo ao qual dedicaram as vidas por tanto tempo. Ezreal e Gwen percebe que nenhum lugar lhes seria seguro, se aquele história fosse real, e ficar de braços cruzados e assistir de braços cruzados a um espetáculo de horror e abuso que se seguiria em sua terra natal não era nada cogitável. N e Megan percebem que não são os únicos encrencados...todos estavam no mesmo barco agora, todos fugitivos, sem um lar de verdade para onde retornarem, com suas vidas destruídas por um mesmo inimigo em comum. O Conselho de Camael precisava cair. Ele, ou Gaia inteira poderia entrar em colapso.

- Precisamos agir - conclui Sana. - Juntos.

- Existem três líderes em Elyin, e cada um controla uma porção deste continente, como um Imperador - explica Sanna. - William Diggori, responsável pelo governo do Oeste. Akira Ryusashi, responsável pelo governo do Leste. E o Velho StoneRage, que dizem ser pai de Nero StoneRage, o homem por trás do Conselho de Camael, e responsável pelo governo do Norte. Não há terras ao Sul de Gaia, apenas o oceano, e ali também vive um imperador, segundo dizem as histórias, mas estas histórias são mais lendas que fatos. - Ela ajeita o cabelo atrás da orelhas, por hábito. - De toda forma, pelo que nossos informantes puderam constatar, Diggori e Ryusashi estavam tentados a aceitar ajuda de Arsin para o desenvolvimento de seus países, acreditando que o governo poderia de fato melhorar a qualidade de vida de seu povo. Mas não o Velho StoneRage...ele discutiu com Nero, se opondo fervorosamente...até o ataque. Quando as forças da falsa Malha de Ferro atacaram a cidade, algo aconteceu e...

- Eles atiraram no pescoço de Nero - comenta Thomas. - Foi assim que o coração de StoneRage amansou. Ele usou sua magia de cura, salvou a vida de Nero e o chamou de filho, pediu desculpas por sua cabeça-dura e disse que aceitaria o pedido do governo.

- E foi assim que o Tratado foi feito - Sanna acena com a cabeça, agradecendo Thomas pelas explicações. - Não imaginava que eles chegariam ao ponto de atirar em Nero de verdade, ariscando sua morte para concluir os planos...isso é ridículo...e genial ao mesmo tempo... - Sanna suspira. - Seu plano é bom, Dakato-san, o problema é se eles elegessem um novo líder com a queda de Daniel, como fizeram com Desmond...eles são Cinco Mil...

Sanna ouve a proposta de Audrey.
- Não tenho dúvidas de que muito são meras marionetes nas mãos de um ventríloco louco...e não imagino se a conversa possa solucionar nossos problemas - Sanna, diferente de Audrey, parece mais impulsionada pelas emoções que pela razão, e Audy percebe isso logo. - De qualquer forma, para falar com alguém, precisamos ir até Arsin, e enquanto estivermos fora, a Nova FASE estará devorando Elyin.
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A expressão de Megan muda, ao ouvir as palavras do homem que ela sempre acreditou de todo o coração que fosse seu pai. Conforme ele avançava na história, seus olhos se encheram de lágrimas, e a menina morde os lábios para segurar as emoções, o coração batendo descompassado, o rosto branco ficando rubro rapidamente.
Quando N abraça a menina, sua única reação é retribuir, tentando envolver aquelas costas tão grandes que sempre a guardaram de todos os perigos, tão machucadas, tão fortes que seus braços de criança não eram capazes de envolvê-las por completo.
Então, Megan segura o rosto do samurai entre suas mãozinhas infantis, e seus olhos azuis fazem N se lembrar vivamente de Norah. E, como ele próprio havia feito muitas e muitas vezes, a pequena Megan limpa as lágrimas do guerreiro na manga da camisa, e sorri, tentando controlar o choro, engolindo as próprias lágrimas que lhe lavavam o rosto com um esforço corajoso.
- Não importa quem me trouxe a esse mundo - ela acarinha o rosto liso do homem, tocando sua testa na dele, como ele próprio sempre fez com ela, fechando os olhos. - Foi você quem cuidou de mim todo esse tempo...foi você que me ensinou...por isso...por isso - ela já não suporte mais segurar o choro, e afunda o rosto no peito de N. - POR ISSO VOCÊ SEMPRE SERÁ O MEU PAI! E EU SEREI SUA FILHA! Não é? Não é? - ela chora, e o coração de N quase estoura de alívio e um sentimento que ele pensava ter perdido da mesma forma que a esperança. Amor.

Ambos sobem para o andar superior, com seus corações leves, e suas almas ainda mais entrelaçadas.